quarta-feira, agosto 17, 2011

A Morgadinha de Botafogo

Recebi o texto abaixo de um amigo. Ele desconhece a fonte. Mas o conteúdo é tão interessante que resolvi postar aqui no meu espaço. Caso alguém conhece o autor, avise. Terei o prazer de dar os créditos à ele ou à ela.

O preconceito é mais antigo do que parece. Os judeus, os índios, os negros, as mulheres e agora os gays. Quem mais terá que esperar pelos seus direitos de seres humanos livres serem respeitados?

Eis o texto:

Enquanto isso, no século XIX

A direção da “Gazeta do Commercio” pediu ao escritor Antonio Manuel de Britto que esfriasse uma das tramas d’“A Morgadinha de Botafogo”, folhetim de sua autoria que vem sendo publicado em capítulos por aquele jornal fluminense. A história de Pancrácia, escrava que recebe carta de alforria de sua proprietária, Don’Anna de Alencar, vem recebendo protestos veementes de alguns leitores. “A Bíblia está repleta de senhores de escravos”, afirma o tenente Josias Macedo Maciel, de Niterói, “o que prova que a escravidão foi criada por Deus Nosso Senhor. Se uma escrava ganha a liberdade, ainda que na ficção, como é que eu vou ensinar aos meus filhos a maneira correta de açoitar os escravos que temos em casa?” Boanerges de Vasconcellos, cafeicultor em Vassouras, acrescenta: “Agora a moda é ser abolicionista. Querem impor a ditadura negra, onde todos terão que ser negros, dançar lundu e comer feijoada. Sinto-me tolhido em meu direito à livre expressão. Não posso mais dizer que essa negrada merece o pelourinho. Ora esta, sou escravocrata, mas não sou preconceituoso”. Ele também negou que sua pregação anti-abolição tenha contribuído para o crescente número de africanos encontrados mortos nos becos e vielas da Corte.

A partir da próxima semana, a personagem Pancrácia terá sua importância diminuída no folhetim. Não aparecerá mais vendendo doces na Rua do Ouvidor, nem embolsando o modesto lucro resultante dessa venda. A “Gazeta do Commercio” quer apaziguar a Liga Conservadora do Brazil, que defende que as pessoas de cor têm um futuro muito mais garantido nas senzalas, onde não precisam se preocupar com o próprio sustento, do que se precisarem trabalhar por conta própria. “Negros libertos são assassinos, ladrões, facínoras, meliantes e canibais”, justifica o Barão de Coary. “Mostrá-los levando vida de branco é um crime contra a natureza e as leis divinas”. O barão também está organizando um movimento de resistência à Princesa Isabel, que, dizem à boca pequena, estaria cogitando a ideia de eliminar a escravatura com uma única canetada. “Este seria um ato ditatorial, contrário às nossas tradições cristãs e à vontade do povo. Mais justo seria se a questão fosse levada a plebiscito. Que consultem aqueles que têm direito a voto – todo os cem mil.”

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